quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Solidariedade ao MST

Temos de repelir a ideia falsa e preconceituosa que tenta indigitar o MST como “inimigo social”, confundindo uma luta legítima com um motim de desordeiros

Temos de repelir a ideia falsa e preconceituosa que tenta indigitar o MST como “inimigo social”, confundindo uma luta legítima com um motim de desordeiros
João Baptista Herkenhoff*


A nosso ver, o MST é o mais importante movimento social do Brasil contemporâneo. O MST nasceu em 1984, por iniciativa de trabalhadores rurais ligados à Igreja Católica.

Segundo dados da CPT (Comissão Pastoral da Terra), órgão ligado a um elenco de Igrejas cristãs, existem, atualmente, cerca de 300 mil famílias vivendo sob o abrigo de tendas de plástico junto às rodovias. Trabalhadores acampados revelam apenas a face militante do grito de Justiça do MST. Se aprofundamos no exame dos dados existentes, a situação real é bem mais dramática.

O Brasil possui 600 milhões de hectares de terra cultiváveis. Entretanto, 2% de proprietários rurais são donos de 48% das terras agriculturáveis. Há latifúndios com extensão superior ao território de países como a Holanda e a Bélgica.

Segundo dados do Atlas Fundiário do INCRA, “existem 3.114.898 imóveis rurais cadastrados no país que ocupam uma área de 331.364.012 hectares. Desse total, os minifúndios representam 62,2 % dos imóveis, ocupando 7,9 % da área total. No outro extremo verifica-se que 2,8 % dos imóveis são latifúndios que ocupam 56,7 % da área total.”

Em cima desses dados, conclui a CPT: “Lamentavelmente, o Brasil ostenta o deplorável título de país com o quadro de segunda maior concentração da propriedade fundiária, em todo o planeta.”

Um terço da população brasileira vive abaixo da linha de pobreza, com renda mensal inferior a 60 dólares. Um oitavo do povo vive abaixo da linha da indigência, com renda mensal inferior a 30 dólares.

Grande parte desses excluídos foram expulsos do campo:

a) por força dos latifúndios que ampliam seus domínios;

b) como consequência das barragens que são construídas sem qualquer atenção àqueles que são removidos do seu chão;

c) e finalmente por causa de juros bancários extorsivos que transformam o pequeno proprietário rural de ontem no homem sem referência e sem horizontes de hoje, a perambular pelas ruas da cidade, ou a buscar a retomada do sonho de viver, nos acampamentos dos trabalhadores sem terra.

A Confederação Nacional da Indústria encomendou uma pesquisa sobre os sentimentos do povo, em relação ao MST. O grau de aceitação e aprovação do MST, no seio da opinião pública, merece nossa atenção:

85% dos respondentes apoiavam as ocupações de terra, desde que sem violência e mortes;

94% consideravam justa a luta do MST pela reforma agrária;

77% encaravam o MST como um movimento legítimo;

88% disseram que o Governo deveria confiscar as terras improdutivas e distribuí-las aos sem-terra.

As marchas do MST, a meu ver, são marchas de luta pela Justiça, são marchas cívicas de salvação nacional.

Quando assusta a migração do campo para a cidade, num país que, por sua imensa extensão territorial, tem vocação agrícola, o que o MST pretende é a migração da cidade para o campo.

Vejo um traço de poesia nessa trajetória: migram da desesperança para a Esperança, da exclusão para a inclusão, da condição de apátridas do abandono social para a condição de construtores da Pátria Mãe gentil de todos nós.

Temos de repelir a ideia falsa e preconceituosa que tenta indigitar o MST como “inimigo social”, confundindo uma luta legítima, que deve merecer nosso apoio e simpatia, com um motim de desordeiros.

Da mesma forma merece esclarecimento a ideia às vezes corrente de que a reforma agrária repartiria a pobreza no campo. Os fatos levam a conclusões diametralmente opostas.

Colocou muito bem o “Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo”:

“Com todas as adversidades, a agricultura familiar responde hoje por 80% do abastecimento dos produtos que compõem a cesta básica e emprega quase 90% da mão-de-obra no campo.

A pequena propriedade gera um emprego a cada 5 hectares enquanto o latifúndio precisa de 223 hectares para gerar um emprego. (...) Dado o desemprego e a deterioração da qualidade de vida nos centros urbanos brasileiros, a vida nas cidades fica cada vez mais insustentável. Neste contexto, a reforma agrária é um elemento central de um novo rumo para o desenvolvimento no Brasil.”


*João Baptista Herkenhoff é livre-docente da Universidade Federal do Espírito Santo e membro emérito da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de Vitória

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